Durante a Pandemia do Covid-19, muitas empresas continuaram em pleno funcionamento, enquanto outras aderiram à redução da jornada de trabalho com a redução do salário do empregado, com base na medida provisória 936 / lei 14.020/20.
A pergunta que surge é se o empregado pode pleitear, na Justiça do Trabalho, a validação da justa causa ao seu patrão, considerando todas Medidas Provisórias, Portarias e Decretos editados e publicados pelo Governo. Ou seja, o empregado que contrai a doença Covid-19 nas dependências da empresa pode, por lei, pedir rescisão indireta, ou seja, pedir para ser ''mandado embora'' pelo seu empregador?
A obrigação de provar o término do contrato de trabalho, quando negados a prestação de serviço e o despedimento, é do empregador, pois o princípio da continuidade da relação de emprego constitui presunção favorável ao empregado.
Logo, retornando à questão da possibilidade da rescisão indireta no caso de o empregado contrair o coronavírus nas dependências da empresa, vale verificar quais são as hipóteses de rescisão indireta, descritas no artigo 483 consolidado, "in verbis":
a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato;
b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo;
c) correr perigo manifesto de mal considerável;
d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato;
e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama;
f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem;
g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.
§ 1º - O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço.
§ 2º - No caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho.
§ 3º - Nas hipóteses das letras "d" e "g", poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo.
Dentre as faltas citadas, é possível a rescisão indireta considerando as alíneas "c" e "d" do referido artigo legal. Especificamente em relação à alínea "c", o empregador submete o empregado a perigo manifesto de mal considerável, que ocorre quando, pelas condições do ambiente de trabalho ou pelo exercício de certa atividade ou tarefa, o empregado corre risco não previsto no contrato, ou que poderia ser evitado.
Sendo assim, as empresas têm a obrigação de cuidar de seus empregados e do ambiente de trabalho, tomando todas as medidas cabíveis e cuidados na prevenção ao contágio pelo Coronavírus, conforme artigo 157, I, da CLT e artigo 7º, XXII, da CR/1988.
É importante que as empresas criem mecanismos de prevenção e proteção dos seus trabalhadores, documentando todas as iniciativas realizadas, a fim de afastar responsabilização injustificada.
Devem ser seguidas as recomendações de reforço de higiene e medidas de saúde, tais como: disponibilização de papéis toalhas, sabonetes líquidos ou detergentes, álcool em gel 70% e distanciamento entre os trabalhadores de, no mínimo, 2 (dois) metros.
A empresa deve divulgar por e-mail, site oficial e/ou redes sociais, informativos sobre a importância de utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI's), e, considerando a COVID-19, o uso obrigatório de máscaras de proteção facial1. As máscaras devem ser fornecidas aos empregados.
Já os empregados que contraíram o novo coronavírus, com a prova da obrigatoriedade da prestação de serviços in loco e na ausência dos cuidados antes mencionados (por parte dos empregadores), terão motivos para exigirem a validação da rescisão indireta na Justiça do Trabalho.
Merece aqui destacarmos que a denúncia do contrato de trabalho deve ser pronta e imediata por parte do empregado.
O empregador deverá comprovar em juízo que todas as medidas de prevenção ao contágio foram tomadas, bem como deverá apresentar recibos de entrega de equipamentos individuais aos seus funcionários e fiscalização do uso correto.
Em relação à prova, na falta de laudos médicos que comprovem que o empregado contraiu o Covid-19, deverá ser feita perícia médica.
A análise das informações de quais lugares o empregado frequentou durante a Pandemia e se outros colegas de trabalho foram contaminados é importante. Isso porque, não tendo notícia de que outros empregados tenham contraído a doença, será descartada a hipótese de contaminação do empregado no estabelecimento empresarial.
Além da rescisão indireta, o empregado poderá pleitear por indenizações por dano moral e material pela alegação de doença ocupacional.
Em suma, a rescisão indireta é cabível na hipótese em que o empregado contrai a doença Covid-19 nas dependências da empresa, desde que haja prova robusta da falta de cuidados e de medidas necessárias e obrigatórias por parte do empregador.
¹Conforme NOTA TÉCNICA GVIMS/GGTES/ANVISA Nº 04/2020, a máscara de tecido NÃO é um EPI, por isso ela NÃO deve ser usada por profissionais de saúde ou de apoio quando se deveria usar a máscara cirúrgica (durante a assistência ou contato direto, a menos de 1 metro de pacientes), ou quando se deveria usar a máscara N95/PFF2 ou equivalente (durante a realização de procedimentos potencialmente geradores de aerossóis), conforme especificado no Quadro.
Fonte: https://sites.google.com/view/covidleistrabalhistas/
Para maiores informações, agende uma consulta.
Dra. Jane Couto Insfran
Pós-graduada em Direito do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie/SP
www.insfranadvocacia.com.br
11- 988252001